quinta-feira, 21 de outubro de 2010

CONTOS DESTA E DOUTRA VIDA

PUREZA EM BRANCO

Psicografia - Chico Xavier
Espírito - Humberto de Campos



Quando Anésio Fraga deixou o corpo físico, ele, que fora sempre considerado puro entre os homens, atingiu a Fronteira do Mundo Espiritual à semelhança de um lírio, tal a brancura de sua bela vestimenta. Pretendia viver nas Esferas Superiores, respirar o clima dos anjos, alçar-se às estrelas e comungar a presença do Cristo – explicou ao agente espiritual que atendia ao policiamento da passagem para os excelsos Planos da Espiritualidade. O zeloso funcionário, contudo, embora demonstrasse profundo respeito para com a sua apresentação, submeteu-o a longo teste, findo o qual, não obstante desapontado, explicou que lhe não seria possível avançar. 
Faltavam-lhe requisitos para maior ascensão.

– Eu? eu? – gaguejou Anésio, aflito. – Como pode ser isso? Fui na Terra um homem que observou todas as regras do Santo Caminho.

Apesar de tudo... – falou o fiscal, reticencioso.

– Não me conformo, não me conformo! – reclamou o candidato à glória divina. E sacando do bolso uma lista, exclamou agastado:
– Pensando na hipótese de alguma desconsideração, resumi em dez itens o meu procedimento irrepreensível no mundo.

E leu para o benfeitor calmo e atento:

Respeitei todas as religiões.
Cultivei o dom da prece.
Acreditei no poder da caridade.
Nunca aborreci os meus semelhantes.
Confiei sempre no melhor.
Calei toda palavra ofensiva ou desrespeitosa.
Calculei todos os meus passos.
Jamais procurei os defeitos do próximo.
Evitei o contacto com todas as pessoas viciadas.
Vivi em minha casa preocupado em não ser percalço na estrada alheia.

O mordomo da Grande Porta, no entanto, sorriu e comentou:
Fraga, você leu as afirmações, esquecendo as demonstrações.

– Como assim?

O amigo paciente apanhou uma ficha e esclareceu que o Plano Espiritual possuía também apontamentos para confronto e solicitou-lhe a releitura da lista.

Principiou Anésio:

– Respeitei todas as religiões...

E o examinador acentuou, conferindo as anotações:
Mas não serviu a nenhuma.

– Cultivei o dom da prece...
Somente em seu próprio favor.

– Acreditei no poder da caridade...
Todavia, não a praticou.

– Nunca aborreci os meus semelhantes...
Entretanto, não auxiliou a quem quer que fosse.

– Confiei sempre no melhor...
 Mas apenas em seu benefício.

– Calei toda palavra ofensiva ou desrespeitosa...
Não se lembrou, porém, de falar aquelas que pudessem amparar os necessitados de consolo e esperança.

– Calculei todos os meus passos...
Para não ser molestado.

– Jamais procurei os defeitos do próximo...
Contudo, não lhe aproveitou os bons exemplos.

– Evitei o contacto com todas as pessoas viciadas...
Atendendo ao comodismo.

– Vivi em minha casa preocupado em não ser percalço na estrada alheia...
Simplesmente para não ser chamado a tarefas de auxílio...

Anésio, desencantado, silenciou, mas o benfeitor esclareceu, sem afetação: Meu amigo, meu amigo! não basta fugir ao mal. É preciso fazer o bem. Você movimenta-se em branco, veste-se em branco, calça em branco e brilha em branco, mas a sua existência na Terra passou igualmente em branco... 

Volte e viva!

Angustiado, Anésio perdeu o próprio equilíbrio e rolou da Altura na direção da Terra...

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